sexta-feira, 24 de junho de 2011

O centenário de Juan Manuel Fangio ( 1911 - 2011 )

Fangio na Mercedes em 1955. O argentino foi campeão
mundial cinco vezes com quatro carros diferentes,
um recorde que dificilmente será batido.


Quando  Juan Manuel Fangio morreu em 17 de julho de 1995, aos 84 anos de idade, o argentino era ainda o recordista de títulos na F1. Seus cinco campeonatos obtidos na década de 50 pareciam intransponíveis já que o homem que poderia batê-lo, Ayrton Senna, estava morto, e Michael Schumacher até então só tinha obtido o título de 1994 e estava ainda caminhando para o seu segundo campeonato no final daquele ano. O alemão só bateria o recorde de Fangio oito anos mais tarde, em 2003, quando conquistaria seu sexto título, e que aumentaria para sete no ano seguinte. O argentino embora tenha morrido como recordista, teve o desgosto de assistir pela TV, apenas um ano antes de sua morte, o acidente fatal de Senna no G.P. de San Marino de 1994. Para Fangio, o brasileiro era o seu legítimo herdeiro e ele tinha certeza que Senna iria pelo menos igualar o seu recorde. O destino,contudo, tinha outros planos.


G.P. da Bélgica de 1950 : Fangio contorna a mitológica
curva La Source, em Spa, a bordo de uma Alfa Romeo.
O piloto ficaria na equipe italiana até a Alfa
se retirar das pistas no final de 1951

Com a morte de Senna seu recorde estava seguro, pelo menos por enquanto. Mas que importância teria isso para um homem da integridade de Fangio ? Coincidência ou não, o argentino só viveria mais 14 meses depois que Senna partiu.  Para um piloto que assistira tantos amigos perderem a vida nas pistas, a morte de Senna foi a gota d'água. O destino foi cruel justamente para o brasileiro, que nunca escondeu para ninguém que achava Fangio o maior de todos.

Se vivo estivesse, Fangio estaria comemorando hoje 100 anos. Mas se o seu recorde de 5 títulos foi suplantado por Schumacher, um outro dificilmente será batido : Fangio foi campeão na F1 com quatro marcas diferentes. Para se ter uma idéia do que isso significa, ninguém conseguiu sequer ser campeão com três...


Fangio em Mônaco 1955 : no final daquele ano, o argentino
ganharia o seu 3º título, mas com a tragédia de Le Mans,
a Mercedes abandonaria as pistas. Sem equipe
Fangio teve que assinar com a Ferrari para 1956

Fangio foi campeão na Alfa Romeo em 1951, na Maserati e Mercedes em 1954, novamente na equipe alemã em 1955, na Ferrari em 1956 e ganhou o seu último título em 1957 mais uma vez com a Maserati. Com títulos em duas equipes diferentes temos 8 pilotos : Jack Brabham (Cooper e Brabham), Graham Hill (BRM e Lotus), Jackie Stewart (Matra e Tyrrell), Emerson Fittipaldi (Lotus e McLaren), Niki Lauda (Ferrari e McLaren), Nelson Piquet (Brabham e Williams), Alain Prost (McLaren e Williams) e Michael Schumacher (Benetton e Ferrari).

O recorde de Fangio é praticamente inalcancável por várias razões. Em primeiro lugar para pelo menos igualá-lo um piloto teria que ter pelo menos quatro títulos, e até hoje, além de Fangio, somente Prost e Schumacher passaram de três títulos. Além disso teria que obtê-lo em quatro equipes diferentes. Com os contratos muito longos da atualidade isso cairia na fronteira do impossível... 

Um livro sobre a carreira de Fangio. Curiosamente
na capa colocaram uma foto de sua temporada
na Ferrari em 1956. A equipe de Maranello foi a
única  em que o argentino não se adaptou e as
brigas, inclusive com Enzo Ferrari, foram muitas

Na época, as circunstâncias obrigaram Fangio a mudar de equipe várias vezes. No final de 1951, a Alfa Romeo se retirou das pistas e o argentino iria para a Maserati, quando sofreu um grave acidente em Monza ficando um ano parado. Voltou as pistas em 1953 pela mesma Maserati, onde ficaria até os meados do Mundial de 1954 quando foi para a Mercedes. Na equipe alemã seria campeão em 1954 e 1955, mas um acidente nas 24 Horas de Le Mans com um carro da Mercedes matou 84 pessoas e a equipe alemã decidiu se retirar das pistas no final de 1955. Repetira a história da Alfa Romeo em 1951. Fangio fica sem equipe e vai para a Ferrari, onde fica apenas um ano. Na equipe de Maranello, apesar de terminar o ano campeão, não se entende com Enzo Ferrari e com seus engenheiros e volta para a Maserati em 1957, onde conquista seu 5º título até abandonar as pistas em 1958. Em apenas 8 temporadas de F1, Fangio correu em quatro equipes diferentes, com uma média de permanência de 2 anos em cada uma e um detalhe impressionante : em todas ele terminou campeão. Uma trajetória totalmente inverossímel para os dias de hoje.


Mike Hawthorn, Fangio, Alfonso de Portago,
Eugênio Castellotti e Peter Collins. Com
exceção de Fangio,  todos morreriam
em acidentes : os três últimos em
pistas de corrida e Hawthorn
num acidente de estrada
Durante esse mesmo período vários pilotos morreram nas pistas, e Fangio nunca foi indiferente a essas mortes, sendo essa uma de suas maiores divergências com Enzo Ferrari que exigia um comportamento de "gladiador romano" de seus pilotos, que tinham que estar "prontos para morrer na pista se fosse preciso", fato que Fangio nunca aceitou. Quando seu amigo Luigi Musso morreu no G.P. da França de 1958, Fangio deu um basta : "não vou mais correr, não aguento mais ouvir que meus amigos morreram". Ele já tinha perdido antes pelo menos uma dezena de amigos como Onofre Marimon, Alberto AscariEugênio Castelotti. Um mês após se retirar, mais um entraria na lista : Peter Collins, que morreu durante o G.P. da Alemanha de 1958.

Como se situaria hoje Juan Manuel Fangio entre os maiores pilotos de todos os tempos. Certamente qualquer pesquisa o coloca entre os três, ou na pior das hipóteses, entre os cinco maiores. O que eu acho ? Bem, para mim os pilotos dos anos 50 e 60 vão ser sempre os maiores, por uma simples razão : eles tinham que lutar não só pela vitória como pela vida. Uma frase de Fangio a respeito disso é emblemática. Perguntado anos depois de se aposentar, se não era incrível o seu recorde de cinco títulos, Fangio respondeu "pode ser, mas muito mais incrível ainda foi eu ter sobrevivido aqueles anos todos..."

Nenhum comentário: