terça-feira, 15 de março de 2011

Correr para Viver ( Patrick Depailler & Robert Kubica )

Mônaco 1979 : Depailler em sua última corrida pela Ligier.
Um acidente de asa-delta tirou a possibilidade do francês
disputar o título do Mundial de Pilotos.

Quando a primeira metade da temporada de F-1 de 1979 terminou, o francês Patrick Depailler, da Ligier, era o terceiro colocado no campeonato e tinhas boas chances de ser o campeão. A F-1 entrou de férias durante um mês do que se aproveitou Depailler para praticar o seu hobby predileto : voar de asa-delta. Em um dos seus vôos, no início de junho, uma rajada de vento jogou sua asa em direção a uma encosta de montanha em Auvergne, no centro da França. Depailler teve múltiplas fraturas nas pernas e nos pés e ficou se convalescendo durante todo o restante da temporada de 1979.

Depailler no hospital se recuperando do acidente
de asa-delta : "Estava de férias..."
Me lembrei disso por ocasião do acidente gravíssimo que Robert Kubica sofreu mês passado em uma corrida de Rally, na Itália, que provavelmente o tirará de toda a temporada deste ano. O polonês recebeu uma saraivada de críticas por arriscar o pescoço numa competição obscura, muito longe do "glamour" da F-1. Hoje isso é inadmissível. Antigamente, não. Era muito comum pilotos de F-1 correrem em outras categorias longe dos holofotes da  principal modalidade do automobilismo e vários até morreram em acidentes como foi o caso de Jim Clark, Bruce McLaren, Pedro Rodriguez, Stefan Bellof, entre outros. Morreram praticando o esporte que tanto amavam, por isso acho um absurdo censurarem Kubica por estar fazendo o que mais gosta na vida : correr, não importa aonde.



Hoje os pilotos estão completamente presos as suas equipes através de contratos que os impedem de correr em qualquer outra categoria senão a F-1. Curiosamente Kubica não estava incluído nesse grupo, principalmente por não estar sobre contrato das quatro maiores equipes de F-1 e que são exatamente as mais severas nessa "exclusividade" : Ferrari, Mercedes, Red Bull Renault e McLaren Mercedes.

O acidente de Kubica deve tirar o polonês de toda
temporada de 2011. Pior pra F-1 que ficará sem
um dos seus melhores pilotos.

 Kubica estreou na F-1 em 2006 e teve uma ascenção meteórica com a BMW, mas já em meados de 2007 sofreu um acidente impressionante em Montreal. O acidente não mudou o estilo do polonês que voltou até mais rápido do que antes. Venceu sua primeira corrida em 2008, mas depois deu azar já que a BMW resolveu se retirar da F-1. Kubica sem opções  foi então para a retalhada Renault, e tem feito milagre desde então, mas também evidenciando um talento enorme que tem sido desperdiçado numa equipe apenas média. Para o "grandprixweb",  Kubica está em um nível acima dos campeões Hamilton e Button e no mesmo nível de Alonso e Vettel, ou seja, dos melhores. Em um post futuro vamos explorar mais o porque desse "desperdício".

Depailler foi um dos pilotos mais
destemidos que já passaram pela F-1.
O rísco fazia parte do negócio, sempre.
Ninguém sabe o que acontecerá com Kubica, sequer se ele terá condições de voltar a pilotar um F-1 normalmente. O mesmo caso aconteceu com Depailler em 1979. Depois do acidente, o piloto foi despedido da Ligier por "justa causa" por ter desobedecido um contrato assinado e ter sido irresponsável ao resolver voar de asa-delta. Depailler se defendeu dizendo que estava de férias, mas todos conheciam o modo do francês encarar a vida, de viver cada momento como se fosse o último.

Um estilo de vida bem dos anos 70, uma época em que a Fórmula 1 era perigosíssima e o profissionalismo exagerado dos tempos atuais simplesmente não existia. Depailler, inclusive, já era reincidente em "irresponsabilidade". Em 1973, Ken Tyrrell começou a testá-lo para ser piloto de sua equipe em 1974 na vaga que seria aberta com a aposentadoria de Jackie Stewart. Mas no meio dos testes, Depailler quebrou uma perna praticando motocross perto de sua casa. Tyrrell ficou furioso e resolveu contratar Jody Scheckter para ser o companheiro de François Cevert em 74. Só que Cevert morreu na última corrida de 1973, abrindo caminho para Depailler que mesmo de muletas disputou as primeiras corridas de 74.

Desprezado pela Ligier, Depailler foi para a Alfa Romeo em 1980.
Depois de um início difícil, os carros italianos ficaram competitivos.
Até que chegou agosto...

Durante os primeiros meses após o acidente de asa-delta, Depailler chegou a correr o risco de ter uma perna amputada. Quando esse risco deixou de existir, e já sabendo que não poderia contar com a Ligier para 1980, Depailler só tinha um pensamento : voltar a correr de qualquer maneira na F-1. O convite veio da Alfa Romeo que estava voltando a categoria depois de quase 30 anos. Quando a temporada começou, em janeiro, Depailler tinha que ser praticamente carregado para dentro do carro. A Alfa começou mal o ano com os carros sempre largando entre os últimos. Mas Depailler sempre foi um grande acertador de carros e já na quarta corrida, em Long Beach, ele conseguiu alinhar o seu Alfa na 3ª posição do grid.

Depailler em sua última corrida, o G.P. da Inglaterra de 1980.
Duas semanas depois ele encontraria a morte,
tão desafiada e desprezada ao longo de toda a sua vida.

A partir daí e até o G.P. da Inglaterra, em julho, Depailler sempre colocava o carro entre os dez primeiros na largada. Tudo indicava que o francês iria colher os frutos no futuro do seu sacrifício - tanto dentro como fora das pistas - para fazer o Alfa competitivo, mas o destino tinha outros planos. Em 1º de agosto, quando estava num teste privado, em Hockenheim, visando o G.P. da Alemanha, algo quebrou no Alfa e o acidente lhe foi fatal. Poucas vezes um destino na F-1 foi tão cruel.


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